domingo, 8 de novembro de 2009

O banho de chuva


A todos aqueles que fazem o que sentem vontade na hora que sentem

Passava das quatro da tarde e eu ia ao encontro de um amigo no shopping. Estava atrasado alguns minutos e resolvi pedir carona a um padre amigo que acabara de rezar a missa das quatro. Além do atraso, a chuva não deixaria que eu chegasse ‘em ordem’ no encontro...

Como chovia!

Ao descer do carro, a chuva já tinha diminuído e não molharia mais a minha roupa, o que era bom, já que eu ia a um encontro.

Ao contornar o shopping e olhar para o chão (uma vez achei cinquenta reais na Lagoa), vi que águas corriam, saindo dos canos que vinham das biqueiras... nossa, que nostalgia eu senti... que vontade de poder ao menos molhar os pés e sentir aquilo que eu sentira quando menino despreocupado que fugia nas horas das chuvas para tomar banho nas biqueiras com outros meninos da minha idade. Lembrei que me dava prazer ter meu corpo todo molhado pela chuva. Nós, meninos da Rua Santo Antônio, ficávamos de bocas abertas para pegar os pingos da chuva; eu não tinha mais de onze anos. Deitávamos nas poças que se faziam, rolávamos no chão, nem aí para a surra que levaríamos ao chegar em casa. Que vontade me deu...

E essa vontade aumentou quando vi um cara todo molhado empurrando um carro de papelão. Possivelmente ele não estava feliz fazendo aquilo, mas eu senti uma inveja, pois como ele não ia encontrar ninguém, podia se molhar, podia caminhar entre a água que corria no canto do asfalto. Mais na frente, vi uma senhora, acompanhada, possivelmente era seu marido aquele que catava papel num carro de mão... Talvez não estivessem felizes naquela hora, mas estavam molhados...

Nessa hora, olhei para o chão, e bem na minha frente tinha uma poça de água que eu tenho certeza que estava gostosa, mas eu não tinha o que fazer, tinha um encontro, e desviei não só da poça, mas do prazer que eu sei que sentiria, pois não poderia me molhar... tinha um encontro!

Cheguei ao local do encontro, meu amigo me aguardava e eu disse: __Quando chegar em casa, lembre-me de escrever, eu preciso.

Não me lembrou, mas a experiência vivida, sim, e agora, a partir daquilo que para muitos não faz sentido, mas que para mim muito significou, me pergunto quantas vezes nós deixamos passar momentos ímpares em nossas vidas, mesmo sabendo que eles não voltarão. Quantas vezes por motivos bobos, fúteis, irrelevantes, castramo-nos, não nos permitimos sentir prazer, quantas vezes...

Ainda bem que, para eu não morrer de remorso, parou de chover!

Jerônimo Vieira, 25/04/09, 21:29

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